Quem concebe um país unicamente como um conjunto de classes profissionais, e nada mais, pensa que viver é só trabalhar. Ora, tal pensamento, em lugar de ser uma verdade óbvia, é um erro para além de óbvio. Se o homem trabalha, é para um fim. Que fim é esse? Depende da idéia que ele tenha formado do que seja esta vida. Como o trabalho é mero meio para alcançar este fim, ele vale menos do que esse fim. Pensar, e por meio do pensamento conquistar a Verdade, amá-LA, servi-LA, eis o grande fim da vida.
A Verdade? Sim, e com "V" maiúsculo. A Verdade, personificada naquele que disse de Si: "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida" (Jo. 14,6).
Uma concepção a-filosófica e a-religiosa da sociedade, meramente econômica e profissionalista, dá origem ao grande desespero das multidões contemporâneas. Ontem estas se esbaldavam para fazer capital, hoje para fazer revolução, e já amanhã para se atirarem no bueiro do miserabilismo niilista, isto é, na glorificação do andrajo e da miséria, da sujeira, do desmazelo e do caos.
Queira-se ou não, mais do que Mamon, é o pensamento que conduz os homens.
Assim, é necessário não só que as profissões se organizem, mas também que surjam opiniões (fagulhas de pensamento a chispear no ambiente hoje tão analfabetizado e pornografizado da vida social). E que essas opiniões se organizem. Que reunam em vastas associações, das mais diversas naturezas, todos os homens para quem pensar ainda é algo. E que estas associações façam sentir ainda sua presença colaborante, estimulante, mas também vigilante, nos corredores dos Legislativos do Brasil. Sou contra o livre-pensamento. Mas também contra o não-pensamento.
Fonte: "O tufão do contrapensamento", Folha de S. Paulo, 11.02.1983
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