Sou tomista convicto. O aspecto da Filosofia pelo qual mais me interesso é a Filosofia da História. Em função deste encontro o ponto de junção entre os dois gêneros de atividade em que me venho dividindo ao longo de minha vida: o estudo e a ação. O ensaio em que condenso o essencial de meu pensamento explica o sentido de minha atuação ideológica. Trata-se do livro Revolução e Contra-Revolução.

12 de junho de 2015

Distinção harmônica entre Igreja e Estado

Um dos princípios fundamentais da Teologia e do Direito Canônico consiste na distinção harmônica entre a Igreja e o Estado.

Sendo o homem criatura de Deus, suas relações com o Criador são absolutamente fundamentais. Por isso, jamais pode o Estado legitimamente descurar da religião.

Antes de Jesus Cristo, a religião constituía um assunto de Estado, e havia uma como que fusão entre a autoridade civil e a religiosa. Com freqüência, chegava-se até a atribuir à dinastia reinante uma origem divina. Ou então se divinizavam os chefes de estado, ainda em vida ou depois de mortos. Por vezes, altas funções de Estado conferiam ipso facto atribuições sacerdotais a seus titulares. Nos países em que existia uma classe sacerdotal, os membros dela eram funcionários públicos direta ou indiretamente sujeitos ao chefe de Estado. De tal maneira a religião, a classe sacerdotal e o Estado se interpenetravam, que constituía crença geral haver em alguma região indefinida batalhas entre deuses de países inimigos, quando as tropas destes se entrechocavam na terra. A vitória ou derrota corriam por conta – pelo menos em parte – da força e da dedicação, ou então da fraqueza e da displicência dos deuses. Não raras vezes, em caso de derrota, estes eram “punidos” pelas multidões enfurecidas. Tais eram as aberrações da idolatria e da superstição.

Nosso Senhor Jesus Cristo instituiu a Igreja com caráter diverso. Ele ensinou o culto a um Deus único, a ser igualmente adorado por todos os povos. A esse Deus único corresponde a existência de uma Igreja una, com um só chefe visível, o Papa, sediado em Roma. Com esta medida, Ele separou os dois poderes, porém, de maneira a que cooperassem intimamente, cada qual em sua esfera, para a glória de Deus e o bem comum dos povos.

O fim dessa Igreja universal é extra-terreno. Sua jurisdição é espiritual. Seu magistério também. Cabe-lhe ensinar e explanar a Revelação contida na Bíblia e na Tradição.

Segundo o disposto por Jesus Cristo, o Estado deve reconhecer a Igreja, respeitar-lhe os direitos originários da missão que seu Divino Fundador lhe deu, e apoiá-la com os meios de ação específicos dele, para que ela realize sua missão espiritual. Contudo, não toca ao Estado qualquer ingerência nos assuntos especificamente religiosos e eclesiásticos.

Mas, ainda segundo o que foi instituído por Jesus Cristo, também o Estado tem uma esfera de ação própria, e nesta não compete à Igreja o direito de imiscuir-se. Pelo contrário, deve a Igreja fazer quanto nela está para ajudar o Poder público temporal.

Com efeito, a cada Estado cabe promover o bem comum temporal (isto é, terreno) do respectivo povo. Assim, tudo quanto diz respeito à independência, prosperidade, bem-estar e progresso de um País está posto sob a ação legislativa, executiva e judiciária do Estado.

Exceto ratione peccati (isto é, quando algo na ordem civil viola a lei de Deus, como é o caso do divórcio, da limitação da natalidade, da laicidade escolar etc.) à Igreja não cabe imiscuir-se em assuntos temporais.

Como se vê, a boa harmonia dos poderes espiritual e temporal se baseia no respeito dessa delimitação de esferas por parte de cada um deles.

Fonte: Sou Católico: posso ser contra a Reforma Agrária?, 1981, pp. 67-68

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