Sou tomista convicto. O aspecto da Filosofia pelo qual mais me interesso é a Filosofia da História. Em função deste encontro o ponto de junção entre os dois gêneros de atividade em que me venho dividindo ao longo de minha vida: o estudo e a ação. O ensaio em que condenso o essencial de meu pensamento explica o sentido de minha atuação ideológica. Trata-se do livro Revolução e Contra-Revolução.

24 de junho de 2015

A voz de quem clama no deserto!

"Vox clamantis in deserto" (Mt. 3,3) – a voz de quem clama no deserto. Com essas belas e sonoras palavras do Batista gostavam de se qualificar os homens públicos do século XIX, ao constatarem que, ante seus brados de alerta, admoestações e conselhos, os acontecimentos não mudavam de curso.

Hoje como que não há mais desertos. Por todas as partes se encontram multidões formadas por homens incontáveis. Entre eles, porém, rareiam os verdadeiros homens, e, quando eles clamam, não o fazem na nobre e desolada solidão das vastidões inabitadas, porém na poluição dos ânimos, dos fatos e das coisas, imersos no caos, na zoeira, e no sono dos que já não agüentam....

Ainda que deva ser vista assim a situação dos brasileiros que persistem em convidar para a vigilância, para a reflexão e para a ação, a TFP, quanto a si, continua obstinadamente a falar. De imediato, porque ela bem sabe quantos são, em meio ao fog, os que pensam cabalmente como ela, e ademais os que, sensíveis pelo menos à voz dela, e com ela concordes nestes ou naqueles pontos, se sentem estimulados a reações esparsas mas saudáveis, porque da TFP ouviram, em alguma ocasião, uma palavra clara, forte e franca... com a qual são consonantes, ainda quando, por vezes, ela lhes pareça exagerada.

Fonte: "Ao término de décadas de luta, cordial alerta da TFP ao Centrão", Folha de S. Paulo, 28.04.1988

17 de junho de 2015

Comunismo: ideologia rebarbativa e indigesta

Nunca será demasiado insistir sobre este ponto: o comunismo não corresponde aos anelos do homem contemporâneo; é ele uma ideologia rebarbativa e indigesta, que os maiores esforços propagandísticos não alcançam inculcar nas massas.

Sempre que a oportunidade se oferece, lembro este grande fato da atualidade. Não porque eu pretenda, com isto, demonstrar que a doutrina comunista é falsa, pois a simples rejeição de uma doutrina pela multidão não é critério para se julgar de seu acerto. É porque a fama de invencível constitui uma das melhores armas de propaganda do comunismo que insisto em lembrar as derrotas dele. Pois desejo, quanto em mim está, destruir esta arma, a qual não passa de blefe publicitário.

Mas, objetará talvez alguém, se eu me preocupo tanto com o comunismo, é evidentemente porque lhe temo o êxito. E se lhe temo o êxito, como afirmo ao mesmo tempo que ele não tem mostrado capacidade para persuadir as massas?

A resposta é simples. A História da humanidade em geral - e a do comunismo em particular - prova que minorias ideológicas bem organizadas podem subjugar, em dadas circunstâncias, e sem grande dificuldade, maiorias inertes, divididas, e minadas pelo derrotismo. Assim, desfazer os temores da maioria autêntica ante o poder de uma pseudo maioria é um dos melhores meios para evitar que esta chegue ao poder.

Fonte: "Comunismo, matrimônio e extermínio", Folha de S. Paulo, 28.05.1969

14 de junho de 2015

Jesus Cristo e sua Igreja serão sempre uma pedra de contradição entre os povos

Disse muito bem Santo Agostinho que a Igreja Católica não pede aos seus adversários outra coisa senão o direito de não ser julgada sem antes ser conhecida. Muitos espíritos superiores deduzem daí que se deve supor que todas as pessoas que condenam a Igreja, só o fazem porque não a conhecem. Esta afirmação, verdadeira em determinados casos particulares, se generalizada passa a ser absolutamente ridícula. Jesus Cristo e sua Igreja serão sempre uma pedra de contradição entre os povos, e o mesmo conhecimento exato do Catolicismo, que em muitos gera o amor, em outros causa ódio. Se a Igreja deseja sempre ser conhecida antes de julgada, fá-lo não só para evitar os efeitos da ignorância de alguns, mas ainda para que fique bem patente o cunho satânico do ódio de outros.

Assim, a franqueza apostólica foi sempre uma regra fundamental de todo proselitismo católico. Excetuadas certas situações especialíssimas, o interesse da Igreja consiste em fazer com que seus arautos a proclamem sem desfiguramentos, sem diluições, sem covardes adaptações ao espírito da época.

Se em todos os tempos esta foi a regra, hoje, mais do que nunca esta atitude se impõe. Ela já não constitui só um ato de elementar coerência com nossos princípios, mas uma medida de soberana sabedoria estratégica. Sabiam-no todos os maníacos de “adaptações ao sabor da época”: vivemos em uma era de radicalismo, e a adaptação de nossos processos de propaganda à época consiste em mostrar o Catolicismo em sua expressão mais radical, despido das sacrílegas maquillages com que muita gente gostaria de desfigurar a sua fisionomia.

Inspiram, pois, compaixão os espíritos insignificantes que julgam, à moda dos mais rançosos “católicões” do século passado, que o único meio de fazer circular as idéias católicas consiste em apresentá-las diluídas em dinamizações tanto melhores quanto mais tênues.

Fonte: "Arautos do Divino Rei", Legionário, nº 478, 9.11.1941

12 de junho de 2015

Distinção harmônica entre Igreja e Estado

Um dos princípios fundamentais da Teologia e do Direito Canônico consiste na distinção harmônica entre a Igreja e o Estado.

Sendo o homem criatura de Deus, suas relações com o Criador são absolutamente fundamentais. Por isso, jamais pode o Estado legitimamente descurar da religião.

Antes de Jesus Cristo, a religião constituía um assunto de Estado, e havia uma como que fusão entre a autoridade civil e a religiosa. Com freqüência, chegava-se até a atribuir à dinastia reinante uma origem divina. Ou então se divinizavam os chefes de estado, ainda em vida ou depois de mortos. Por vezes, altas funções de Estado conferiam ipso facto atribuições sacerdotais a seus titulares. Nos países em que existia uma classe sacerdotal, os membros dela eram funcionários públicos direta ou indiretamente sujeitos ao chefe de Estado. De tal maneira a religião, a classe sacerdotal e o Estado se interpenetravam, que constituía crença geral haver em alguma região indefinida batalhas entre deuses de países inimigos, quando as tropas destes se entrechocavam na terra. A vitória ou derrota corriam por conta – pelo menos em parte – da força e da dedicação, ou então da fraqueza e da displicência dos deuses. Não raras vezes, em caso de derrota, estes eram “punidos” pelas multidões enfurecidas. Tais eram as aberrações da idolatria e da superstição.

Nosso Senhor Jesus Cristo instituiu a Igreja com caráter diverso. Ele ensinou o culto a um Deus único, a ser igualmente adorado por todos os povos. A esse Deus único corresponde a existência de uma Igreja una, com um só chefe visível, o Papa, sediado em Roma. Com esta medida, Ele separou os dois poderes, porém, de maneira a que cooperassem intimamente, cada qual em sua esfera, para a glória de Deus e o bem comum dos povos.

O fim dessa Igreja universal é extra-terreno. Sua jurisdição é espiritual. Seu magistério também. Cabe-lhe ensinar e explanar a Revelação contida na Bíblia e na Tradição.

Segundo o disposto por Jesus Cristo, o Estado deve reconhecer a Igreja, respeitar-lhe os direitos originários da missão que seu Divino Fundador lhe deu, e apoiá-la com os meios de ação específicos dele, para que ela realize sua missão espiritual. Contudo, não toca ao Estado qualquer ingerência nos assuntos especificamente religiosos e eclesiásticos.

Mas, ainda segundo o que foi instituído por Jesus Cristo, também o Estado tem uma esfera de ação própria, e nesta não compete à Igreja o direito de imiscuir-se. Pelo contrário, deve a Igreja fazer quanto nela está para ajudar o Poder público temporal.

Com efeito, a cada Estado cabe promover o bem comum temporal (isto é, terreno) do respectivo povo. Assim, tudo quanto diz respeito à independência, prosperidade, bem-estar e progresso de um País está posto sob a ação legislativa, executiva e judiciária do Estado.

Exceto ratione peccati (isto é, quando algo na ordem civil viola a lei de Deus, como é o caso do divórcio, da limitação da natalidade, da laicidade escolar etc.) à Igreja não cabe imiscuir-se em assuntos temporais.

Como se vê, a boa harmonia dos poderes espiritual e temporal se baseia no respeito dessa delimitação de esferas por parte de cada um deles.

Fonte: Sou Católico: posso ser contra a Reforma Agrária?, 1981, pp. 67-68

8 de junho de 2015

Esta é nossa finalidade, nosso grande ideal, a civilização católica

* Engana-se singularmente quem supuser que a ação da Igreja sobre os homens é meramente individual, e que ela forma pessoas, não povos, nem culturas, nem civilizações.

* Com efeito, Deus criou o homem naturalmente sociável, e quis que os homens, em sociedade, trabalhassem uns pela santificação dos outros. Por isto, também, criou-nos influenciáveis. Temos todos, pela própria pressão do instinto de sociabilidade, a tendência a comunicar em certa medida nossas idéias aos outros, e, em certa medida, em receber a influência deles. Isto se pode afirmar nas relações de indivíduo a indivíduo, e do indivíduo com a sociedade. Os ambientes, as leis, as Instituições em que vivemos exercem efeito sobre nós, têm sobre nós uma ação pedagógica.

* Resistir inteiramente a este ambiente, cuja ação ideológica nos penetra até por osmose e como que pela pele, é obra de alta e árdua virtude. E por isto os primitivos cristãos não foram mais admiráveis enfrentando as feras do Coliseu, do que mantendo íntegro seu espírito católico embora vivessem no seio de uma sociedade pagã.

Assim, a cultura e a civilização são fortíssimos meios para agir sobre as almas. Agir para a sua ruína, quando a cultura e a civilização são pagãs. Para a sua edificação e sua salvação, quando são católicas.

Como, pois, pode a Igreja desinteressar-se em produzir uma cultura e uma civilização, contentando-se em agir sobre cada alma a título meramente individual?

* Aliás, toda a alma sobre a qual a Igreja age, e que corresponde generosamente a tal ação, é como que um foco ou uma semente desta civilização, que ela expande ativa e energicamente em torno de si. A virtude transparece e contagia. Contagiando, propaga-se. Agindo e propagando-se tende a transformar-se em cultura e civilização católica.

* Como vemos, o próprio da Igreja é de produzir uma cultura e uma civilização cristã. É de produzir todos os seus frutos numa atmosfera social plenamente católica. O católico deve aspirar a uma civilização católica como o homem encarcerado num subterrâneo deseja o ar livre, e o pássaro aprisionado anseia por recuperar os espaços infinitos do Céu.

E é esta nossa finalidade, o nosso grande ideal. Caminhamos para a civilização católica que poderá nascer dos escombros do mundo de hoje, como dos escombros do mundo romano nasceu a civilização medieval. Caminhamos para a conquista deste ideal, com a coragem, a perseverança, a resolução de enfrentar e vencer todos os obstáculos, com que os cruzados marcharam para Jerusalém. Porque, se nossos maiores souberam morrer para reconquistar o sepulcro de Cristo, como não queremos nós – filhos da Igreja como eles – lutar e morrer para restaurar algo que vale infinitamente mais do que o preciosíssimo Sepulcro do Salvador, isto é, seu reinado sobre as almas e as sociedades, que Ele criou e salvou para O amarem eternamente?

Fonte: "A Cruzada do Século XX", nº 1, Janeiro 1951