Sou tomista convicto. O aspecto da Filosofia pelo qual mais me interesso é a Filosofia da História. Em função deste encontro o ponto de junção entre os dois gêneros de atividade em que me venho dividindo ao longo de minha vida: o estudo e a ação. O ensaio em que condenso o essencial de meu pensamento explica o sentido de minha atuação ideológica. Trata-se do livro Revolução e Contra-Revolução.

30 de julho de 2014

A esquerda perderá a batalha da popularidade

Se a esquerda for açodada na efetivação das reivindicações "populares" e niveladoras com que subiu ao poder; - se se mostrar abespinhada e ácida ao receber as críticas da oposição; - se for persecutória através do mesquinho casuísmo legislativo, da picuinha administrativa ou da devastação policialesca dos adversários, o Brasil se sentirá frustrado na sua apetência de um regime "bon enfant" de uma vida distendida e despreocupada. Num primeiro momento, distanciar-se-á então da esquerda. Depois ficará ressentido. E, por fim, furioso. A esquerda terá perdido a partida da popularidade.

Em outros termos, se os esquerdistas, ora tão influentes no Estado (Poderes 1, 2 e 3), na Publicidade (Poder 4) e na estrutura da Igreja (Poder 5), não compreenderem a presente avidez de distensão do povo brasileiro, deixarão de atrair e afundarão no isolamento. Falarão para multidões silenciosas no começo, e pouco depois agastadas.

Fonte: Cuidado com os pacatos, Folha de S. Paulo, 14.12.82

23 de julho de 2014

Deve-se ser moderado em tudo, até na própria moderação

Há momentos em que o espírito temperante está disposto à ação, e outros ao repouso, momentos em que sua alma aspira aos píncaros austeros e outros aos vales risonhos. Mas, porque é equilibrado, ele sabe que sua vida foi feita para os horizontes sublimes e gravíssimos que a Fé lhe revela, na alternativa entre as glórias régias do Céu e a tragédia eterna do inferno, pondo em jogo a cada instante o Sangue de Cristo. Ele sabe que a vida tem momentos de prazer e horas de luta, momentos de repouso e momentos de trabalho, de dor e de alegria, de intimidade e de solenidade. O homem equilibrado não ignora que a própria sanidade de sua alma pede estas alternativas. E por isto ele não quererá passar a vida toda num só destes climas, no "heróico" ou no "moderado".

Mais ainda. Seus estados de espírito não ficarão à mercê dos ventos indecisos de sua sensibilidade. O homem ponderado sabe portar-se à altura das circunstâncias, não mostrando uma grandiloqüência ridícula nas ocasiões triviais, nem uma trivialidade estulta nas grandes situações.

Isto que se diz de um homem temperante também se diz de um povo temperante. Quando um povo está no seu apogeu, não revela estes grandes desequilíbrios de alma, estas fomes e estes fastios mentais imoderados, parecidos com a fome e o fastio dos doentes. É o que se pode dizer da Inglaterra vitoriana, por exemplo, igualmente esplêndida na grandeza do Império e no encanto de sua vida privada.

Evidentemente, não vivemos em um século de equilíbrio mental. E se algum leitor pensa o contrário estremeça, pois é algum desequilíbrio em sua alma, que o leva a enganar-se tão complemente a respeito de um fato evidente como o sol.

O resultado é que temos de tudo, em matéria de intemperança. Temos "heróicos" intemperantes, como "moderados" intemperantes, e temos toda a gama intermediária. Pois o teclado da intemperança tem mil notas.

Destas intemperanças, a "moderada" parece entretanto ser hoje, entre nós, a mais generalizada.

Em boa parte pelo menos, é isto natural. Pois a guerra deu para saciar de grandezas dramáticas e melodramáticas. (...) Ora, quanto esta tendência "moderada" se vai tornando preponderante, é fácil ver.

Nos artigos de jornal, nos discursos, nas conferências, até nas conversas particulares, as opiniões que se afirmam com mais desembaraço, mais ênfase, mais eco são sempre as "equilibradas", as "moderadas", as de meio termo. Todo mundo que ataca uma opinião procura denunciá-la como "extremada". E seus defensores procuram esquivar-se desta pecha como se disso dependesse o êxito de sua causa.

Fonte: Moderação, moderação: slogan que enche o Ocidente, Catolicismo Nº 38, fevereiro de 1954

17 de julho de 2014

Ainda que a Igreja seja devastada pelos lobos da heresia...

Cumpramos o nosso dever. E se depois de termos feito todo o possível - a palavra “todo” significa tudo, mas absolutamente tudo, e não apenas “um pouco” ou “muito” - resignemo-nos diante da avalanche que vem. Porque ainda que pereçam o Brasil e o mundo inteiro, ainda que a própria Igreja seja devastada pelos lobos da heresia, ela é imortal. Nadará sobre as águas revoltas do dilúvio. E é de dentro de seu seio sagrado que sairão depois da tempestade, como Noé da Arca, os homens que hão de fundar a civilização de amanhã.

Fonte: Legionário, Meditação política em torno do Triunfo e da Paixão do Filho de Deus, 21.3.1937

16 de julho de 2014

Por que razão a Igreja abençoa as espadas?

Por que razão a Igreja abençoa a espada dos militares que, recebendo as dragonas do oficialato, se incorporam à alta direção das forças armadas? Por que timbra ela em dar às espadas, que são instrumentos de morte, uma bênção que é o penhor da proteção do Deus vivo? Porque a Igreja não vê na espada dos militares senão o baluarte da justiça. A espada do militar é, para a Igreja, não o instrumento com que se mata em guerra de conquista, mas o meio de defesa do direito lesado, da civilização agredida, da moral conspurcada. E se o próprio Salvador não relutou em empunhar o açoite com que flagelou vigorosamente os vendilhões do templo que conspurcavam os direitos de Deus, a Igreja não poderia deixar de abençoar as espadas com que o Estado arma seus paladinos, para a defesa dos direitos da Igreja, da Civilização e da Pátria.

Em outros termos, significa isto que a Igreja, a despeito das entranhas maternais que A movem em relação a todos os seus filhos, não reluta em abençoar a violência, desde que ela seja a santa violência da ordem contra a desordem, do bem agredido contra o mal agressor, da vítima prejudicada contra o causador do dano injusto. É necessário, evidentemente, que a violência só seja empregada quando todos os outros meios se esgotaram para restabelecer o direito lesado.

É necessário, além disto, que ela não exceda em virulência ao limite do estritamente indispensável para a defesa da Justiça. Estas duas ressalvas feitas, entretanto, o exercício da violência não constitui apenas um direito, mas deve, às vezes, constituir um imperioso dever.

Realmente, quando a espada da Justiça se deixa paralisar pela inércia, embora a civilização periclite, a Pátria corra risco e os direitos da Igreja sejam calcados aos pés, ela colabora por omissão com o mal contra o bem, com a anarquia contra a civilização, com o demônio contra Deus. Deserta de seu dever sagrado. Perde o direito ao respeito que merecia. E se transforma, de sublime instrumento de defesa, em inútil fonte de gastos inúteis, ou odioso meio de opressões.

Fonte: Benção de espadas, Legionário, nº 245, 23.5.1937

A Contra-Revolução: condição essencial do verdadeiro progresso

A Contra-Revolução é progressista? Sim, se o progresso for autêntico. E não, se for a marcha para a realização da utopia revolucionária.

Em seu aspecto material, consiste o verdadeiro progresso no reto aproveitamento das forças da natureza, segundo a Lei de Deus e a serviço do homem. Por isso, a Contra-Revolução não pactua com o tecnicismo hipertrofiado de hoje, com a adoração das novidades, das velocidades e das máquinas, nem com a deplorável tendência a organizar more mechanico a sociedade humana. Estes são excessos que Pio XII condenou com profundidade e precisão.

E nem é o progresso material de um povo o elemento capital do progresso cristãmente entendido. Consiste este, sobretudo, no pleno desenvolvimento de todas as suas potências de alma, e na ascensão dos homens rumo à perfeição moral. Uma concepção contra-revolucionária do progresso importa, pois, na prevalência dos aspectos espirituais deste sobre os aspectos materiais. Em conseqüência, é próprio à Contra-Revolução promover, entre os indivíduos e as multidões, um apreço muito maior por tudo quanto diz respeito à Religião verdadeira, à verdadeira filosofia, à verdadeira arte e à verdadeira literatura, do que pelo que se relaciona com o bem do corpo e o aproveitamento da matéria.

Por fim, para demarcar a diferença entre os conceitos revolucionário e contra-revolucionário de progresso, importa notar que o último toma em consideração que este mundo será sempre um vale de lágrimas e uma passagem para o Céu, ao passo que para o primeiro o progresso deve fazer da terra um paraíso no qual o homem viva feliz, sem cogitar da eternidade.

Pela própria noção de reto progresso, vê-se que este tem por contrário o progresso da Revolução.

Assim, a Contra-Revolução é condição essencial para que seja preservado o desenvolvimento normal do verdadeiro progresso, e derrotada a utopia revolucionaria, que de progresso só tem aparências falaciosas.

Fonte: Revolução e Contra-Revolução, Parte II, p. 77

14 de julho de 2014

Mito da Revolução francesa: artimanha de gerações de revolucionários

É muito mais fácil manter uma visão otimista e glorificante da Revolução Francesa, fora e longe da França, que dentro dela. Porque sobre o solo francês ainda permanecem, por assim dizer, as torrentes de sangue derramadas pela Revolução. Nos ecos da vida francesa ainda como que se ouvem os gemidos, os bramidos, as aclamações, as exclamações, os protestos, os argumentos de gerações inteiras que se tem sucedido na Franca, discutindo a Revolução.

De modo que, para os franceses é muito mais concebível a Revolução ser discutida e atacada, do que para populações de países distantes, onde ela pode ser apresentada folcloricamente como um acontecimento triunfal, à maneira de um bolo de noiva, todo branco.

A globalidade do povo francês apresenta uma atitude muito mais questionante em face da Revolução, do que por exemplo o público brasileiro, ou de qualquer outra parte da Terra.

Como o mundo lucraria em perceber que dentro da França se acredita menos no mito da Revolução, do que se acredita fora da França! E compreender assim a grande artimanha levada a cabo por gerações de revolucionários, para arrastar o mundo — sem análise, curvado diante do fato consumado — a uma aceitação vil da Revolução Francesa. Aceitação sem discernimento, sem inteligência e sem coragem.

Na discussão que vem se desenvolvendo na França a respeito da Revolução de 1789, podemos distinguir duas etapas. A primeira vai até fins do século passado, quando começou a ser posta em prática uma aliás controvertidíssima política de aproximação dos católicos com a democracia moderna, conhecida como "Ralliement".

Até o "Ralliement", a idéia era de que altar e trono constituíam duas vítimas da Revolução, solidárias porque a Revolução as odiava de um mesmo ódio e queria afogá-las num mesmo sangue. De fato, a Revolução igualitária de 1789 desencadeou simultaneamente uma perseguição anti-religiosa e anticlerical e outra antimonárquica e antinobiliárquica. E por detrás dessa dupla perseguição, havia um único pensamento, que os revolucionários desejavam impor como molde para as idéias, para a ação e para a estruturação do mundo inteiro.

Tal pensamento falso baseava-se no seguinte princípio metafísico: a desigualdade faz sofrer aqueles que estão embaixo. É sempre penoso para o amor-próprio humano ter superior. E por causa disso, as organizações anti­igualitárias, hierárquicas de qualquer ordem, seriam odiosas. Por exemplo, adotada a ótica revolucionária, torna-se explicável que um trabalhador manual lamente não ser burguês; que um burguês lamente não ser nobre; que um nobre lamente não ser príncipe; e um príncipe lamente não ser rei. A natureza humana seria hostil à idéia de ter um superior, e por causa disso a estrutura hierárquica faria sofrer os homens.

Fonte: Uma revolução igualitária movida pela inveja, Catolicismo, nº 475, julho de 1990

Revolução Francesa: sede ilimitada de igualdade absoluta

O defeito, no caso, é a inveja. Ou seja, toda a ralé moral dos invejosos, dos que não admitem que outrem tenha mais ou seja mais, daqueles a quem dói que alguém seja mais do que eles — ainda que seja mais inteligente, ou então fisicamente mais forte — toda esta ralé moral encontra neste mito da igualdade uma espécie de abolição do sofrimento que lhe trazem suas más inclinações. Assim como suprime sua sede quem bebe água, assim também suprimiria a tortura invejosa dessa desigualdade quem bebesse as águas da igualdade.

A aceitar tal posição, o grande primeiro revolucionário foi Lúcifer, que se doeu diante da suprema desigualdade de Deus, e quis estabelecer a igualdade no Céu. Nessa perspectiva, a primeira Revolução não foi a francesa nem sequer foi humana: foi angélica. E povoou o inferno! É a conclusão inevitável.

A inveja, como os demais vícios, tem qualquer coisa de insaciável. E quando se encontra afinal atendida, ela provoca esgares de contentamento. contorções de alegria, de que o homem poucas vezes tem noção, porque há um certo pudor do invejoso em declarar-se inteiramente invejoso. Para fazer tal declaração, ele teria de reconhecer sobre si uma superioridade. E já isso ele não quer.

Mas, em geral, as paixões humanas desordenadas tendem para um certo paroxismo, um certo frenesi, no qual os homens imaginam encontrar uma delícia. A embriaguez, por exemplo, é assim. O bêbado bebe, bebe, bebe, e é experimentando a náusea, praticando atitudes ridículas como jogar-se no chão, é nesse horror que ele encontra um estado de plena satisfação do seu desejo do álcool. Os efeitos do álcool são para ele como que um falso céu — o céu do inferno, se quiserem. Mas são para ele um falso céu.

Um frenesi desse tipo, o contra-ideal da igualdade produz em todos os invejosos do mundo. Esse desejo frenético da igualdade, existente nos invejosos, é semelhante à vontade do bêbado de ingerir álcool, ou do drogado de tomar a droga, ou do homem sensual de praticar a impureza. São coisas do mesmo gênero.

É uma apetência subconsciente, ou conforme o caso consciente, desse estado de plenitude exasperada, de plenitude furibunda da satisfação da inveja: nisto consiste o motor do espírito revolucionário.

E a Revolução Francesa só matou, só queimou, só incendiou, só profanou, só blasfemou, só praticou todos os horrores que fez, porque o revolucionário sentia nisso o gozo que Satanás imaginava ter, se com a sua revolução angélica pudesse derrubar a Deus. Então, dentro do seu delírio psicótico, ele teria querido calcar Deus aos pés. E é só no momento em que, se possível fosse, Satanás sentisse que debaixo de seus pés imundos — antropomorficamente falando — se contorcia e morria a Verdade absoluta, o Bem absoluto, o Belo absoluto, é que ele teria dado a gargalhada que seria o gozo frenético de sua vida: "Ah, ah!! Morreu afinal aquele que era mais do que eu!"

Esse estado de espírito diabólico é tão real que, bons teólogos o afirmam, se fosse dado ao demônio sair do inferno, ir para o Céu, pedir perdão por seus pecados, e reintegrar-se no Céu, na felicidade eterna, ele não quereria!

O demônio é apresentado acorrentado no inferno, e é verdade, mas apenas num sentido da palavra. Porque se lhe oferecessem o Céu, ele não o desejaria. Ele não quer contemplar a Deus no seu verum absoluto, no seu bonum absoluto, no seu pulchrum absoluto, porque isto é mais do que ele. E ele prefere ser um revoltado, eternamente desgraçado, mas blasfemando sempre, do que calcar em si seus sentimentos de inveja e penetrar na felicidade eterna.

Para compreendermos o fio condutor da Revolução Francesa — vinda ela mesma do Protestantismo, Humanismo, Renascença, como largamente se demonstra no livro "Revolução e Contra-Revolução" — é preciso compreender esta sede ilimitada de igualdade absoluta, que é o motor da Revolução universal, e que a levou por estas e aquelas maneiras a produzir estas e aquelas convulsões. E a chegar, portanto, aos extremos que nós conhecemos.

Então, se a pergunta é: Você é a favor ou contra a Revolução Francesa? A resposta deve ser: — Você é do partido da inveja ou do partido da hierarquia? Hierarquia ordenada, hierarquia harmônica, hierarquia magnífica, mas hierarquia, e que não seria ordem nem seria harmonia, nem teria magnificência, se não fosse hierarquia. Esta é a verdadeira pergunta de fundo.

Fonte: Uma revolução igualitária movida pela inveja, Catolicismo, nº 475, julho de 1990


3 de julho de 2014

A impossível coexistência pacífica da Igreja com o comunismo

A coexistência pacífica da Igreja com o comunismo deve ser recusada pelos católicos:

1º argumento – A ordem temporal exerce uma ação formadora – ou deformadora – profunda sobre a alma dos povos e dos indivíduos. A Igreja não pode, pois, aceitar uma liberdade que implique em calar sobre os erros do regime comunista, criando no povo a impressão de que Ela não os condena.

2º argumento – Renunciando a ensinar os preceitos do Decálogo que fundamentam a propriedade privada (7º e 10º Mandamentos), a Igreja apresentaria uma imagem desfigurada do próprio Deus. O amor de Deus, a prática da virtude da justiça e o pleno desenvolvimento das faculdades do homem, e, portanto, a sua santificação, ficariam assim gravemente prejudicados.

3º argumento – A Igreja não pode aceitar o comunismo como um fato consumado e um “mal menor”.

Fonte: Acordo com o regime comunista – para a Igreja, esperança ou autodemolição?, p. 67