Sou tomista convicto. O aspecto da Filosofia pelo qual mais me interesso é a Filosofia da História. Em função deste encontro o ponto de junção entre os dois gêneros de atividade em que me venho dividindo ao longo de minha vida: o estudo e a ação. O ensaio em que condenso o essencial de meu pensamento explica o sentido de minha atuação ideológica. Trata-se do livro Revolução e Contra-Revolução.

14 de julho de 2014

Revolução Francesa: sede ilimitada de igualdade absoluta

O defeito, no caso, é a inveja. Ou seja, toda a ralé moral dos invejosos, dos que não admitem que outrem tenha mais ou seja mais, daqueles a quem dói que alguém seja mais do que eles — ainda que seja mais inteligente, ou então fisicamente mais forte — toda esta ralé moral encontra neste mito da igualdade uma espécie de abolição do sofrimento que lhe trazem suas más inclinações. Assim como suprime sua sede quem bebe água, assim também suprimiria a tortura invejosa dessa desigualdade quem bebesse as águas da igualdade.

A aceitar tal posição, o grande primeiro revolucionário foi Lúcifer, que se doeu diante da suprema desigualdade de Deus, e quis estabelecer a igualdade no Céu. Nessa perspectiva, a primeira Revolução não foi a francesa nem sequer foi humana: foi angélica. E povoou o inferno! É a conclusão inevitável.

A inveja, como os demais vícios, tem qualquer coisa de insaciável. E quando se encontra afinal atendida, ela provoca esgares de contentamento. contorções de alegria, de que o homem poucas vezes tem noção, porque há um certo pudor do invejoso em declarar-se inteiramente invejoso. Para fazer tal declaração, ele teria de reconhecer sobre si uma superioridade. E já isso ele não quer.

Mas, em geral, as paixões humanas desordenadas tendem para um certo paroxismo, um certo frenesi, no qual os homens imaginam encontrar uma delícia. A embriaguez, por exemplo, é assim. O bêbado bebe, bebe, bebe, e é experimentando a náusea, praticando atitudes ridículas como jogar-se no chão, é nesse horror que ele encontra um estado de plena satisfação do seu desejo do álcool. Os efeitos do álcool são para ele como que um falso céu — o céu do inferno, se quiserem. Mas são para ele um falso céu.

Um frenesi desse tipo, o contra-ideal da igualdade produz em todos os invejosos do mundo. Esse desejo frenético da igualdade, existente nos invejosos, é semelhante à vontade do bêbado de ingerir álcool, ou do drogado de tomar a droga, ou do homem sensual de praticar a impureza. São coisas do mesmo gênero.

É uma apetência subconsciente, ou conforme o caso consciente, desse estado de plenitude exasperada, de plenitude furibunda da satisfação da inveja: nisto consiste o motor do espírito revolucionário.

E a Revolução Francesa só matou, só queimou, só incendiou, só profanou, só blasfemou, só praticou todos os horrores que fez, porque o revolucionário sentia nisso o gozo que Satanás imaginava ter, se com a sua revolução angélica pudesse derrubar a Deus. Então, dentro do seu delírio psicótico, ele teria querido calcar Deus aos pés. E é só no momento em que, se possível fosse, Satanás sentisse que debaixo de seus pés imundos — antropomorficamente falando — se contorcia e morria a Verdade absoluta, o Bem absoluto, o Belo absoluto, é que ele teria dado a gargalhada que seria o gozo frenético de sua vida: "Ah, ah!! Morreu afinal aquele que era mais do que eu!"

Esse estado de espírito diabólico é tão real que, bons teólogos o afirmam, se fosse dado ao demônio sair do inferno, ir para o Céu, pedir perdão por seus pecados, e reintegrar-se no Céu, na felicidade eterna, ele não quereria!

O demônio é apresentado acorrentado no inferno, e é verdade, mas apenas num sentido da palavra. Porque se lhe oferecessem o Céu, ele não o desejaria. Ele não quer contemplar a Deus no seu verum absoluto, no seu bonum absoluto, no seu pulchrum absoluto, porque isto é mais do que ele. E ele prefere ser um revoltado, eternamente desgraçado, mas blasfemando sempre, do que calcar em si seus sentimentos de inveja e penetrar na felicidade eterna.

Para compreendermos o fio condutor da Revolução Francesa — vinda ela mesma do Protestantismo, Humanismo, Renascença, como largamente se demonstra no livro "Revolução e Contra-Revolução" — é preciso compreender esta sede ilimitada de igualdade absoluta, que é o motor da Revolução universal, e que a levou por estas e aquelas maneiras a produzir estas e aquelas convulsões. E a chegar, portanto, aos extremos que nós conhecemos.

Então, se a pergunta é: Você é a favor ou contra a Revolução Francesa? A resposta deve ser: — Você é do partido da inveja ou do partido da hierarquia? Hierarquia ordenada, hierarquia harmônica, hierarquia magnífica, mas hierarquia, e que não seria ordem nem seria harmonia, nem teria magnificência, se não fosse hierarquia. Esta é a verdadeira pergunta de fundo.

Fonte: Uma revolução igualitária movida pela inveja, Catolicismo, nº 475, julho de 1990


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