Fazemos a apologia de doutrinas de luta e de força, luta pelo bem é certo, e força a serviço da verdade. Mas o romantismo religioso do século passado desfigurou de tal maneira em muitos ambientes a verdadeira noção de Catolicismo, que este aparece aos olhos de um grande número de pessoas, ainda em nossos dias, como uma doutrina muito mais própria “do meigo Rabí da Galiléia” de que nos falava Renan, do taumaturgo um tanto rotariano por seu espírito e por suas obras, com que o positivismo pinta blasfemamente Nosso Senhor, parecendo ao mesmo tempo enaltecê-lo, do que do Homem Deus que nos apresentam os Santos Evangelhos.
Costuma-se afirmar, dentro desta ordem de ideias, que o Novo Testamento instituiu um regime tão suave nas relações entre Deus e o homem, ou entre o homem e o seu próximo, que todo o sentido de luta e de severidade teria desaparecido da Religião. Tornar-se-iam assim obsoletas as advertências e ameaças do Antigo Testamento, e o homem teria ficado emancipado de qualquer obrigação de temor de Deus ou de luta contra os adversários da Igreja.
Sem contestar que realmente na lei da graça tenha havido uma efusão muito mais abundante da misericórdia divina queremos demonstrar que se dá às vezes a este fato gratíssimo um alcance maior do que na realidade ele tem. (...)
O Divino Mestre pregou certamente a misericórdia, mas não pregou a impunidade sistemática do mal. No Santo Evangelho, se Ele nos aparece muitas vezes perdoando, aparece-nos também mais de uma vez punindo ou ameaçando. Aprendamos com Ele que há circunstâncias em que é preciso perdoar, e em que seria menos perfeito punir; e também circunstâncias em que é preciso punir, e seria menos perfeito perdoar. Não incidamos em um unilateralismo de que o adorável exemplo do Salvador é uma condenação expressa, já que Ele soube fazer, ora uma, ora outra coisa.
Fonte: Em defesa da Ação Católica, pp. 283 e 284
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